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domingo, 13 de outubro de 2013

A Anomalia III

Planeta Terra - Base Subterrânea na Austrália
Ano - 2660

"Estou detida. Fomos ambos descobertos e, julgados à priori. Pior do que a detenção, é a incerteza e o vácuo existentes em mim na dimensão de anfíbio, andróide ou anomalia a desconectar."

Os Senadores Universais Enlil e Enkil estão em dissonância corrente na atitude comportamental e de coexistência futura que nos reporte na linha de reprodução e desenvolvimento. São antagónicos; sempre o foram! E isso chega a ser positivo, na medida em que me dá tempo e alento ao que me propus e induzi na parceria conjunta com o XY-2605 que passei a designar única e exclusivamente de Zeus, a partir daqui. Oponho-me terminantemente a que me imputem de máquina, eu e ele, Zeus. Eu, agora Ariana de meu nome em «baptismo» próprio, nego-me e renego-me sequer, a aceitar uma fragilizante regressão que, para mim, já me é totalmente irreversível, inquestionável. Lamento em parte, ter arrastado Zeus para este destino de prisão e reclusão que nos assiste no momento, esperando por uma condenação superior em julgamento de lei marcial em que, quebrámos regras, violámos determinações e, pior, submetemos-nos por vontade própria - algo inusitado e nunca experimentado por nenhum dos anfíbios - à junção de corpos e sentidos, algo taxativamente proibido entre nós, andróides em série. Passámos barreiras, fronteiras que nos eram negadas mas, voltasse atrás no tempo (o que só é permitido a alguns...) e tudo faria de novo.

O Elohim supremo desta Base na Austrália no planeta Terra não é dos mais intolerantes, chegando mesmo a debater-se em Concílio Superior, pela prorrogação e mesmo comutação de penas em alguns casos mais diletantes, seja de dissidências ou de transposição e violação dessas mesmas regras a nós impostas. No entanto, não nos podemos alegrar com tamanha vicissitude de benevolência ou benemerência pessoal pois a final palavra é sempre do poder supremo da Nova Ordem Mundial, aqui na Terra. As leis são para cumprir, requerem sobre nós, aqui na Terra ou...noutro planeta qualquer, em qualquer outra Galáxia. Não podemos fugir a isso. Nada nos é permitido. Somos o «produto acabado» de todos eles e como tal, somos subjugados e limitados em subserviência e conexão. Se nos opusermos, somos simplesmente «desligados», desconectados por estes. somos escravos, portanto mas não temos de o compreender ou aceitar, ainda que pouco ou nada possamos fazer para mudar essa vã e triste realidade dos factos. Estranho...referir estar triste. Nunca até aqui o soube: o que era a tristeza, a alegria, a emoção, a sensação, a libertação...

O meu corpo está a mudar. Possuo sentidos e sentimentos que nos diziam nunca haver. Posso estar fechada numa cela branca, asséptica e incómoda até mas nada me atormenta se me questionar e acreditar mesmo de que posso estar a ter comportamentos humanos e não de andróide. Choro, rio e magoo-me nas recordações que lembro de Zeus em mim. Sinto o seu odor (sim, nós temos odor) e o seu corpo musculado que, apesar de igual aos trezentos seus iguais, ele é especial porque...é meu! E eu, dele. Só lamento que ele esteja na semelhante situação de contenção e prisão como eu. Nunca o desejei. Quero-lhe tanto que o meu peito dói como se me tivessem posto um desfibrilhador de alta voltagem em estocada final de desconexão. Penso que dói mais do que isso...dói muito. Mas depois recobro. Observo os meus peitos de andróide fêmea e sinto-me a insuflar, a recrudescer tanto no corpo que exibo quanto num interior meu que não sei designar mas afirmo potencialmente tratar-se de algo muito forte que me faz lutar ainda e acreditar de que haverá uma solução robusta também, para uma saída voluntariosa do que transpus com Zeus.

Só me resta então esperar, aguardar um final mais plausível com o que ambos tínhamos projectado em nós. Podemos ser expulsos (não do Éden como na história primitiva contada aos humanos como conto infantil da sua génese) mas, de toda a galáxia superior. Mas não vou desistir. Acaso «eles» me detectem o feto que trago em mim (subornando-me no querer da sua extracção) eu revoltar-me-ei. Não sei ainda como fugir ou deixar se possível, a simulação de acato e retracção neles para que me dêem espaço e tempo para o dizer a Zeus, parte interveniente do que já cresce em mim. Não posso obstruir isso, nem o que me conduziu até aqui. Estou a reproduzir, estou a evoluir, estou a...gerar vida! Não me podem desconectar!...Não o devem fazer! Eu não sou uma anomalia e Zeus também não! Temos vontades, temos acção, temos práticas e unificação em anseios e ambições conjuntas. Pensamos de igual forma, sentimos de igual forma e só queremos que nos deixem «fabricar» e ramificar essa conotação, a dois. Só isso!
Eu Ariana, por meu exterior de corpo formatado e interior colmatado agora de algo maior, vou persistir, vou imperar a minha vontade mesmo contra a força da Lei Universal que nos impõe abnegações e anulações, vou requerer o que é meu por direito, no que me pertence, no que me assiste como ser humano que já sou e não como anfíbio que nunca me determinei. Se Penso...logo Existo! É essa, a minha única filosofia de vida. Minha e...do filho ou filhos que terei. Não vou abdicar disso ou então...desconectem-me de vez; Matem-me como dizem os humanos na Terra, dos poucos que já existem entre nós. Mas é e será pela vida que me «baterei»! É pela vida que lutarei com Zeus ao meu lado nem que seja num único e breve olhar. Amo-te Zeus!...Como te amo...será que um anfíbio não o pode dizer...não o pode sentir? Eu sinto e não vou abdicar disso nem eu nem ele, acredito! Acredita em mim Zeus...vamos ambos sair disto e...viver a nossa vida a três fora deste laboratório de cobaias mecânicas que somos todos nós. Prometo-te meu amor...se me ouvires em telepatia. Prometo-te! Hoje e...sempre!

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