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segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

A Capital dos Mortos



No interior dos muros de Cuzco, no Peru, os missionários espanhóis encontraram os cadáveres mumificados dos governantes dos Andes já falecidos. Evidência demonstrada pelo clima seco do deserto do vale peruano de Nazca, onde milhares de cadáveres mumificados dos Kahuachi se mantiveram incólumes ao longo de 2000 anos.

Necrópoles no Deserto Peruano
A cena produzia um efeito macabro. Na praça central de Cuzco, a capital do Império Inca, estavam dispostos os cadáveres dos soberanos dos povos dos Andes. "Os mortos brindaram uns com os outros com «chicha»", relata o padre Cobo, um missionário espanhol, no século XVI.
O brinde foi pronunciado simbolicamente pelos criados dos soberanos mumificados, pois os Incas tratavam dos seus reis na morte como o haviam feito em vida, serviam-lhes refeições e bebidas e, transportavam-nos em liteiras pelas ruas da cidade. A cidade dos vivos era assim também, a cidade dos mortos.
Ao verem como os corpos de todos os soberanos Incas se mantinham impecavelmente conservados, os conquistadores ficaram boquiabertos. O cronista Polo de Ondegardo escreve assim: "Nem um único cabelo, uma sobrancelha ou mesmo uma pestana lhes faltava."
Os invasores espanhóis não conseguiram descortinar o segredo da mumificação e, muito menos, a permanência para a posteridade da maioria das múmias reais e, dos seus tesouros em ouro. Trata-se de questões que os cientistas - ainda hoje - continuam a investigar nos mais modernos laboratórios e, nas enormes necrópoles do Peru.

Mumificação para a Vida no Além
Em 1999 foi encontrado um dos maiores cemitérios Incas em Tupac Amaru, perto de Lima, no Peru, que se julga datar do século XV. Sob a direcção do arqueólogo Guillermo A. Cock foram postos a descoberto mais de dois mil e duzentos fardos de múmias, correspondentes a indivíduos de todas as classes sociais..
Todos os cadáveres estavam embrulhados em panos e haviam-lhes sido colocados alguns objectos pessoais na sepultura. Este é um costume que remonta já aos tempos das culturas que antecederam os Incas nestas regiões. No Sul do Peru, o vale de Nazca, apresenta-se repleto de buracos, semelhantes a sinais de bexigas - pois muitos milhares de câmaras sepulcrais foram aí abertas por saqueadores de túmulos e, arqueólogos.
Nos terrenos arenosos e secos, os mortos dos Kahuachi mantiveram-se impecavelmente conservados ao longo de dois mil anos. Os seus esqueletos ainda se apresentam cobertos de pele, os dentes e os cabelos estão como novos e, em algumas cabeças, chegam mesmo a existir ainda os globos oculares.
Os mortos foram colocados sentados, com os joelhos encostados ao pescoço, como um feto no ventre materno em câmaras subterrâneas. As oferendas funerárias indicam que, os membros da cultura Nazca, acreditavam firmemente numa continuação da vida após a morte.

Templo da Morte
Os povos pré-Incaicos - como é o caso da cultura Colla no lago Titiaca - sepultavam os seus mortos em cidades funerárias subterrâneas, dotadas de uma concepção fantástica.
Construíam imponentes torres circulares a partir de grandes blocos de basalto - as chamadas, «chullpas», os templos da morte de Sillustani - nos quais emparedavam os seus nobres mumificados, juntamente com o seu séquito, as suas mulheres e os lendários tesouros.
Em 1971, os arqueólogos descobriram debaixo de uma dessas torres funerárias não apenas numerosos cadáveres mas também, um tesouro com quatro quilos de ouro.
Hoje em dia sabemos que a mumificação por meio da secagem do cadáver pelo ar do deserto ou sobre uma fogueira, já era praticada desde 4000 a. C. Deste modo, os mortos poderiam iniciar a sua viagem para o Além. Ninguém poderia então prever que, as oferendas em ouro, pudessem vir a despertar mais tarde a cobiça das gerações vindouras do modo como despertaram, a ponto de se chegar a perturbar o seu descanso eterno.

A Capital dos Mortos
Chanchán, a antiga capital dos Chimú, é de certo modo, uma necrópole especial. Este povo indígena agressivo era governado por Reis-Deuses que dominavam um império estendendo-se ao longo de mil quilómetros da costa Norte do Peru.
Bairros residenciais de aspecto palaciano (as ciudadelas) eram protegidos com muros de 10 metros de altura e 600 metros de comprimento, feitos com tijolos de adobe. As residências e os armazéns, os espaços destinados à administração, os palácios e os túmulos dos antepassados estavam ligados entre si por um labirinto de corredores. Quando um rei morria, era sepultado com grande sumptuosidade no seu palácio, juntamente com centenas de mulheres jovens que, o deveriam acompanhar na morte.
Por tudo isso, Chimú era já nos seus tempos áureos (de 900 a 1476 d. C.) uma cidade onde vivos e mortos conviviam.

Finalizando então, impomos a seguinte pergunta: que Reis-Deuses eram por conseguinte esses que, legitimados por um poder supremo, haveriam de fazer sacrificar todo um povo - ou parte dele - em sequência e subserviência máximas de os seguirem até na morte? E, o porquê ou razão da mumificação geral num todo - ainda não desmistificado por nós ou, pelos investigadores e arqueólogos que o estudam - na conclusão devida do que estes povos e seus Reis-Deuses soberanos aí vivenciaram; até, para além da morte propriamente dita. Lamenta-se que, pela extrema cobiça do ouro e sua busca, estes povos não tenham descansado em paz mas, com o iluminar da História em correcção e preservação, acreditamos que não mais estes sejam acordados do seu sono eterno. A bem da História, da Ciência e, das Humanidades por que nos regemos todos em códigos e regras universais, assim converteremos estes conhecimentos em registo, datação e perpetuação incólumes do que nos foi deixado pelos nossos antepassados. Assim seja então!

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