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domingo, 7 de fevereiro de 2016

A Experiência II: A Criação!


Algures no planeta Marte... o que medeia, restringe, mas também prolifera numa outra civilização híbrida! Eu e o Blue - e mister T - além o imaginário; além o suposto com as estrelas vigiando...

Tenho saudades da Terra! Tenho saudades dos meus filhos: do seu cheiro, do seu riso e das suas malandrices matinais, aquando nos queriam acordar para um mundo natural que não artificial como este que agora vivemos...

Estou só com os meus pensamentos, com as minhas lágrimas e a réstia  dos meus sentimentos de outrora numa quase ancestralidade jocosa e, defeituosa, que me desfoca as imagens, os desejos, e os sentidos de poder tocar (uma só vez que fosse...) nos meus queridos filhos, nos meus amores. Que será deles agora...? Poeira estelar, estrelas do Céu, que Céu...? Que alcançarei em Marte: a fé, a esperança, o desejo... ou o amor? Não aqui, não em Marte... ou estarei enganada? Poderei acreditar que aqui, nesta profunda caverna vermelha onde me encontro, e onde nada me faz supor poder voltar (um dia...) à Terra, ainda serei feliz? Eu... que estou só, tão só como o pó cósmico que se infiltra mais na alma que no corpo, mas se espalha por todo o Universo sem deixar rasto atrás de si...

13 de Janeiro de 2016 - Marte
Finalmente alcançámos a zona equatorial: a zona mais benevolente deste tão cavernoso planeta de ninguém. O Blue tem sido incansável. E mesmo inestimável, nos conhecimentos que obtém desta tão árida terra que tanto já sofreu também. Blue é um ser do género masculino de um planeta que dista da Terra muitos e muitos anos-luz e que, por eficiência e inteligência ultra-personalizada, usa de toda a sua extra-dimensional sapiência, revelando-se próximo de mim, como uma criatura de plenos e ostensivos poderes que na Terra não imaginávamos poder sequer existir. Como um Deus. Como um Salvador. Para já: como meu salvador!
Dia-a-dia vamo-nos compreendendo melhor e até auxiliando-nos nas tarefas diárias que aqui vamos tendo e supostamente alternando, para que a rotina nos não fustigue a desesperança de daqui sairmos sem que nave alguma estrangeira nos venha buscar. O Blue tem emitido essa informação mas até agora nada. Mas não se pode desistir: ele afiança-me isso com o seu olhar. Fala pouco, mas fala. Por incrível que pareça, Blue é um ser poliglota (das línguas da Terra e outras, de sons ou fonética intraduzível), no que me parece ter sido assim uma espécie de máquina robotizada/programada para o efeito; e, não sendo ele uma, acaba invariavelmente por ser tão superior quanto um computador do mais alto software estelar. A minha insignificância perto de si é confrangente. Sinto-me por vezes diminuída mas faço por não o transparecer: os humanos são muito básicos, disse-me ele um dia destes - e eu amuei. Mas Blue tem razão: somos mesmo muito pouco avançados, retrógrados mesmo. Ou pouco espertos; e por vezes, mal-cheirosos. Não gostei, mas tive de o admitir: afinal, somos uma espécie civilizacional que está na Terra há muito poucos milénios...

Tentei superar traumas e tentar ser como ele, Blue. Não foi fácil, mas tentei. E os dias tornaram-se penosos e pesados. A esperança começou a dar lugar ao desespero, à tristeza e à fuligem dos dias negros de grandes poeiras, grandes tempestades que eu pensei já não viver mais - não em Marte, no seu exterior, mas em mim... do que de dentro sobressaía em mágoa, lamento e fúria de aqui me terem despejado como esterco de gado, como adubo terrestre numa terra que ninguém merece viver.
Foi então que me apercebi de outras coisas: do pesadelo vigente que nos aguça a inteligência ou talvez o regurgitar dos meandros neurológicos há muito esquecidos - ou nem sequer referenciados - na distante apoteose daquela outra parte cerebral que está adormecida e que, o ser humano, nunca fará coalescer sem disso se aperceber ou dessa necessidade ampliar. O vulto anatómico de super bomba bacteriológica que agora sou, exponencia-me uma extra-posição de um corpo a descoberto em face a um planeta ainda mais secreto do que aquele que reporto em mim: principalmente em relação ao que experiencio também sobre uma atmosfera de Marte tão caótica quanto exemplar, se reconhecermos o quão somos de tão subliminarmente semelhantes: do pó ao pó; da poeira ao horizonte cosmológico; e tudo isto sem refreio ou reprimendas de sermos, ambos, tão diferentes e no fundo tão iguais.

Se tivéssemos pisado a Lua, seríamos ambos - eu e o Blue, para além do mister T - uma massa informe ou disforme de vulgar matéria e anti-matéria de neutrinos confusos, diletantes e amorfos talvez, se tivermos em conta o que as substâncias energéticas e materiais dos nossos corpos se poderiam misturar, confundir ou até diluir, por entre toda a componente galáctica. Eu sei que parece confuso, talvez o seja mas, em toda esta componente extraplanetária, há que sublevar que ainda estamos vivos e isso, é o melhor que a nossa consciência pode fabricar neste momento! E que, sob este estranho Céu de imensas estrelas e planetas - secos e áridos, quentes e gélidos - nós somos: eu e o Blue e até mister T, os heróis sobreviventes nesta louca profusão do Tudo que existe no Universo. Algo que, nem mesmo a Teoria do Tudo de Stephen Hawking, poderia explicar... nem mesmo pela sua mais exímia essência quântica na multi-pluralidade ou coexistência de vários universos, de várias teias cósmicas de muitas estradas, muitas cordas, e muitos enviesados trilhos por que se regem os caminhos desse transporte subquântico - em interestelar magnitude - por onde uns viajam e outros se deixam adormecer sob atalhos de verme, atalhos de nada em sucção de Stargates ou Wormholes ainda mais fictícios do que os que existem na realidade.
Desculpem-me a complexa teorização deste Tudo, que no fundo visualiza apenas o Nada: pelo menos é o que sinto, em relação a este território ou, a um inexistente salvamento interestelar do reino de Blue ou de outro seu vizinho planetário que não o meu, que aqui me deixou plantada sem resgate possível.

Marte tem atmosfera. Mas tal não me deixa sonegar o que na Terra vivi; o que na Terra senti em verdadeira amostragem do que é estar vivo! Do que é ser feliz!
Por mais incrível que pareça, passámos numa cratera que tem o nome de «Aveiro»... sim, Aveiro, essa bela cidade de Portugal dos moliceiros - barcos tradicionais de Aveiro de descendência fenícia e que tão belos são - e dos conventuais e deliciosos ovos moles que nos fazem criar cáries mas nos levam ao paraíso. Mas tudo seria irreal quando comparado com essa tão maravilhosa terra minha, pois que orlando em mapeamento sideral o que Marte expõe (de uma outra cratera que se denomina Lisboa), e o meu coração não suportaria mais, despejando no terreno sofridas lágrimas de sangue por ver quão longe eu estou daquela outra terra deste igual nome. E Blue não entendeu. A saudade de casa; a saudade do que se deixou para trás; a saudade que goteja na alma como punhal cravado em lacerada hemorragia que jamais estanca, que jamais se cura por tão profunda ser a ferida. E chorei, acalmada apenas pela angústia de mister-T e dos seus movimentos sobre mim, insurgindo-se na impotência de me reverter aquela tão grande tristeza de estar longe de tudo.

Mas o périplo tinha de prosseguir: tínhamos de continuar ou morreríamos gelados em hipotermia glacial que oscila entre os -70ºC a -140ºC nos pólos (felizmente que de tal nos afastámos, ou a nossa sobrevivência estaria em causa) por muito que me debelasse, por vezes, a continuar, sentindo-me fraca e débil perante a parede estática e fortemente concebida do másculo Blue que nada rejeita, nunca desistindo, nunca permitindo que ambos cedêssemos à intempérie de Marte.
E eu, a mais perfeita idiota ao cimo de Marte, em sacramental anuência de me estar a magnetizar perante a realidade marciana - sob a carapaça das invisíveis ondas electromagnéticas que me revelaram o quanto eu era um ser menor - fiz-me estancar no passo, engolir o pó e atrasar o Blue e o mister-T na cruzada. E isto, para além da sentença sobre mim aplicada como espada afiada (e sob a cratera de Magalhães que possui 105 quilómetros de diâmetro, ao que o Blue me explicou) dos muitos quilómetros que ainda faltavam percorrer (mesmo que utilizássemos em deslocação o veículo motor de propulsão magnética que por vezes falhava...).
Mas mais uma vez, eu me tentei abstrair do tão árduo caminho, registando essa referência de homenagem ao meu tão eminente descobridor e navegador português, Fernão de Magalhães. E, se não fosse o cansaço e o desmazelo - mais da alma do que do corpo - e teria feito como os norte-americanos fizeram na Lua, deixando aí uma suposta e mui volátil bandeira do meu pequeno mas alvo país, Portugal. Não deu tempo nem permeio de tal fazer, mas também não o esquecerei, mesmo que mister-T me tenha acordado desse entorpecimento (por instantes...) em me fazer voltar ao solo de Marte, sentindo que a distância e o prolongamento desta tão terrífica estadia, ainda se pronunciaria por muito mais tempo... e acatei. Também porque não havia solução...

O Blue possui uma espécie de GPS estelar em que por via satélite (segundo o meu parco conceito de entendimento e compreensão da coisa) me dá a conhecer toda a dinâmica territorial e de morfologia marciana: assim como se estivéssemos perante uma enorme tela de cinema em que vemos e, observamos, toda a pulsante vida, desde o Monte Olimpo (a segunda montanha mais alta do nosso Sistema Solar), assim como o Valles Marinaris, no gigantesco desfiladeiro que ocupa 40% do planeta, como é sabido por toda essa gente da Terra.
Mas quando a noite cai... tudo fica mais negro. Negro, frio e obsoleto, até o veículo que é movido a energia solar, quando tudo o resto falha. E é na noite que tudo dói mais.... a solidão, a incerteza, a saudade e a incoerência destes dias sobre o desconhecido. Tudo dói. Demais! Choro que nem Madalena arrependida (nem sei por que razão o digo... a não ser pelas saudades, muitas, de meus filhos mortos agora, mesmo que as suas almas pertençam já ao grande Cosmos...) e observo, lá do alto, a lua de Fobos (penso que é a de Fobos...) pela outra que está encoberta de Deimos e só se consegue almejar aquando os ventos e as poeiras cessam, sem que haja interferências de maior.

Na superfície, pudemos atingir com o olhar e, perante toda a nossa surpresa, os desvelos mecânicos da ainda Mars Exploration Rover Opportunity que tudo faz para retransmitir novos dados aos terrestres, aos da NASA, aos da ESA, aos de outros mundos que até se riem de nós, ante toda a nossa ingénua performance espacial terrestre, de jurássica apresentação e compleição - diz-me confrangente o Blue. Mas, não me querendo intimidar ou ferir na maior sensibilidade de nos chamar de estúpidos - aos da Terra - tenta, com toda  a veleidade e circunstância, colmatar ou mesmo sonegar certos factos científicos desses outros mundos que nos vigiam como nós terrestres, vigiamos o meio ambiente ou as formas de micro-organismos sob o nosso global solo. Podia ser triste essa realidade, mas não o é; apenas a consciência de estarmos (na Terra) a anos-luz de um maior conhecimento cosmológico. Mas lá chegaremos... um dia...

A Mars Science tem surtido efeito; pelo menos no que tenta transmitir para a Terra. O Blue diz-me que assim tem de ser, pois o que esta Mars Science Laboratory Curiosity  recupera de Marte, é apenas o que os seus de origem nos deixam conhecer. O que nos insurge na condição de terrestres parvos, pelo que ainda hoje não sabemos, não traduzimos nem sequer descodificamos das encriptadas mensagens nos solos ou sobre as linhas de Nazca, no Peru. Somos tão ignorantes e tão inactivos que chega a meter dó. Mas, se nos ensinarem, se nos derem essa oportunidade, para lá caminharemos...

21 de Janeiro de 2016
Esta data é histórica! Épica e com uma sigla de triunfo, pois que nos vimos chegados, finalmente, ao término de todas as nossas questões. Desde o dia 13 de Janeiro que sentimos que podemos ser mais, alcançar mais, ter aquela surtida esperança que nunca é de mais...
Foi com alegria, entusiasmo e alguma excitação de crianças que não éramos, que nos vimos chegados aos suportes-vida de uma Base Alienígena. Não sendo a da civilização de origem de Blue (pois Blue pertence ao que me disse ser muito comparável ao recém-descoberto KIC 8462852 - a estrela distante da Terra, extremamente luminosa e que, revela ter um padrão de luz que poderá indicar a presença de uma estrutura alienígena). Esta, é similar; assim como uma espécie de sucursal em Marte dessa hipotética KIC e que, tal como esta, na sua sede e planeta de origem, exibe um Enxame de Mega-estruturas (que exponencia a luminosidade de mega-painéis fotovoltaicos em poderosa e inimaginável energia de luz, cor e calor...) que os astrónomos consideraram, no momento, estar localizado a 1550 anos-luz de distância da Terra entre as constelações de Cyrus e Lira, depois da nossa galáxia - a Via Láctea!

Por muito que o Kepler tenha exposto esta realidade estelar, nada será (eventualmente!) como a vertente residual e, factual, do que desta estrela/planeta se exortará, pelo que Blue me elucidou deste seu planeta ser exuberantemente brilhante, sedutor e... magnânimo! Acreditei. Até porque era o planeta de Blue. Senti-o firme, possante e orgulhoso. Afinal Blue, tem sentimentos!
O que à priori se estabeleceu em órbita sobre Marte, acabou por ser compactado no solo deste planeta vermelho, em mega-estrutura alienígena (pelos extraterrestres de um exoplaneta ainda desconhecido na Terra mas muito similar ao Kepler 425 b, da constelação Cygnus, que está a 1400 anos-luz da Terra), mas que, evidentemente, estará a muitos mais anos-luz do que se retratará em civilização milenar no cosmos. Marte, era apenas (ou tinha sido...) um mero suporte-sustentáculo de referência e, permanência, devido a objectivos muito claros, especificados para determinada finalidade e que, supostos e alcançados estes, se retiraram sem preocupações de levantarem o que anteriormente tinham içado e implementado em dinâmica astronómica sobre Marte.
Esse desperdício, esse despojo capital megalómano, como eu lhe chamei e Blue acabou por reiterar, serve-nos agora de pouso, retiro e refúgio de ambos; para além de mister-T que ficou radiante por poder dormir descansado sem os ventos cósmicos, sem os distúrbios nocturnos marcianos tanto de temperaturas extremas como da pouca viabilidade capsular que eu e Blue compúnhamos, até aqui ter chegado. Para além do meu oxigénio estar quase a acabar, o que me seria fatal, caso não tivéssemos aqui chegado tão prontamente. Não tão rápido assim, mas agora já posso dormir em paz. Por enquanto...

Aqui chegados, a coisa foi fenomenal. Corremos que nem loucos - eu e mister-T - que se deixou encantar por todos os cantos e recantos, inspeccionando todos os locais, vendo se acaso haveria alguma subespécie escondida - e hipoteticamente fatal - para a nossa permanência aqui. Não havia ou pelo menos não foi por nós detectada até ao momento. « Preciso urgentemente de dormir. E de sonhar...» - Foram os meus pensamentos na altura. Há tanto tempo que não sabia o que era, de novo, uma casa... uma casa onde ficar...

Senti-me aparvalhada. Senti-me a mais saloia e primitiva criatura ou medieval ser civilizacional, ante o que os meus olhos viam de tecnologia inacreditável! E pensar que tudo tinham deixado para trás sem o buscar, sem o reorganizar, ou tentar recuperar naquele tempo e espaço havido em Marte. Como era possível tanta riqueza estelar, tanto despojamento ou desperdício do que ficara para trás...? Mas agradecia-lhes por isso (em pensamento), pois só assim eu e Blue sobreviveríamos; só assim chegaríamos a bom porto... marciano! E em segredo, orei por ele, Blue, por mim e até por mister-T que, tal como cachorro domesticado e não acossado, se deixou envolver por ambos neste escasso período de tempo de sobrevivência e, assistência fora dos suportes-vida da Space-X. Parecia ter passado um milénio...

Nenhum astrónomo o poderia compreender, nenhum astrofísico o poderia reconhecer: era tudo novidade! E continua a ser! O que anteriormente orbitava por Marte ( e por outras várias estrelas e planetas extra-solares ou exoplanetários) situa-se a nossos olhos numa auto-sustentação que parece ter vida própria. Depressa pudemos reavivar e, reviver, velhos hábitos e novos costumes pelo que no antes e no depois, soubemos exemplarmente explanar em toda a linha: desde o banho tomado, às leguminosas reinseridas em estufas para o efeito de sustentação alimentar, aos passeios fora dos suportes-vida em que a atmosfera de Marte até nos parece convidar em harmonia e, consequência vital, de estarmos a criar vida aí. A partir desse momento, em que aqui chegámos, e tudo era (e ainda é!) como se um enorme cérebro - metódico e vigilante (em argúcia inteligente) - nos encaminhasse para uma suposta viela de reconhecimento de área, de insinuação civilizacional, sentindo ambos o quanto é perceptível este «cérebro invisível» ter esperado por nós, ter esperado pela nossa presença. Não sei como, mas ambos o sentimos; até Blue, que parece estar a ser agora mais humano e menos robótico do que lhe conhecera inicialmente - ainda que ele não seja muito diferente de mim, anatómica e morfologicamente.

Hoje, tudo me parece mais claro, transparente e de certa forma mais obreiro de uma causa. Às vezes penso que fomos - automática e prudentemente - sendo encaminhados para aqui. Por alguma razão que não sei explicar. Mas sinto, e tão fortemente, quanto a presença do cheiro dos meus filhos que já não tenho em mim. E isso, não sendo a única coisa que me dói, é a que mais me fere, saber que apenas possuo a recordação desses tão doces momentos...

30 de Janeiro de 2016
A minha perspicácia lusitana do «desenrasca», faz-se aqui como o mais natural caminho de luz de pirilampos por um trilho escuro e ignoto de nenhures, ou seja, eu sempre encontro uma brecha, uma fresta, ou uma lasca sequer, por onde entra a luminosidade do «savoir faire». Quero com isto dizer que, só me falta fazer tartes de maçã, pois aqui tudo se encontra. Mas não há gordura animal, aliás, não há derivados de animais, o que se induz ser algo de muito mais limpo, reprodutivo não só de uma atitude vegetariana (que não compõe só vegetais mas outras substâncias orgânicas não existentes na Terra, mas igualmente saborosas e distintamente nutritivas) sem se andar com o cutelo atrás de qualquer ser vivo que grunha e, nevralgicamente (por células nervosas cerebrais ou de sistema nervoso central) se remeta de dor e sofrimento. Pode-se viver e sobreviver em subsistência perfeitamente saudável e recrudescente, sem ser necessária a ingestão de produtos animais que na Terra (sabemo-lo há muito!) nos são prejudiciais. Algo que o mister-T aplaude ou já estaria nalgum espeto de churrasco gigante em delícias de uma outra qualquer civilização cósmica mais atrasada, primitiva ou selvagem: tal como na Terra!

A minha coscuvilhice é endémica: sou portuguesa e sou assim! Ou não fossem os meus navegantes de aquém e além-mar o terem sido igualmente, e nunca teriam descoberto as Índias, as Américas e tudo o mais. Até mesmo o já tão estafado Tratado de Tordesilhas que há quem arremesse ter sido a ímpia solução (ou rasteira falaciosa sobre os nossos vizinhos de Castela...) o termos rachado ao meio em mapeamento e deslumbramento, o mapa-mundi de então, cabendo-nos a parte melhor ou dos interesses e conhecimentos já estabelecidos por terras de Além-mar. Se tivesse vivido nessa época não teria sido diferente: jogaria o mesmo xadrez humano de omissos interesses! Eu sou assim: imune ao mutismo e implacável quanto à acção em motivação e afronta sobre o alheio. E isso... viu-se aqui.

O Blue avisou-me dos perigos ou dos socalcos tecnológicos em meandros .desconhecidos por mim - e por ele - sobre o que eventualmente bloquearia a nave de comando-central daquela imensa estrutura alienígena. Mas a minha curiosidade foi maior do que o previsto: depois de me cansar de ver as sementes eclodirem, o mister-T a andar a correr atrás da cauda e do Blue passar horas ilimitadas sobre um visor perfeitamente incompreensível ou admissível de qualquer entendimento ante os meus parcos conhecimentos informáticos estelares, acabei por me ver introsar por salas e mais salas de autêntico encantamento sideral. E tudo vasculhei, em que, as luzes, as cores, as reentradas num mundo cósmico e quântico (além tudo o que eu poderia conhecer...) se tornaram a infância perdida em magia galáctica de outros mundos e, no seio ou meio, daquele outro em que eu, Blue e mister-T agora vivíamos.

Marte tem tanto para dar e receber! Desde as portentosas linhas de escorrência recorrentes (em dados recolhidos pela Mars Reconnaissence Orbiter, do que eu me lembrava aquando para aqui vim...) além as suas bio-geográficas potencialidades ainda não totalmente descobertas pelos homens da Terra. Se eles o soubessem... e sentir que tudo o mais está a ser convenientemente explorado por outros seres, outros meios que não os da Terra. E para isso, tanto há por ramificar... e os da Terra sabem disso! Mas há outros mais que nem suspeitam: que «eles», os dos outros mundos aqui fazem, aqui instalam e fazem proliferar...

Enquanto Blue vai explorando técnicas invasivas de recapitulação estelar (e outras...) eu vou-me entretendo, penetrando na evasão de um cosmos interior que aqui se faz emanar. Não sei se é uma atitude disruptiva com tudo o que me conheceu até aqui, só sei que me faz abstrair de tudo o que perdi. Enquanto isso, Blue, o cientista azul que me acompanha e estuda os limites de Marte, vai tentando perfazer - em registo e confluência químicas nos compostos que reproduz - a investigação, sobre Marte. Desde o mais lato elemento no planeta que se compõe de dióxido de carbono (95,32%), ao nitrogénio (2,7%), argónio (1,6%), oxigénio (0,13%), monóxido de carbono (0,08%), assim como pequenas quantidades de água, óxido de nitrogénio, neon, hidrogénio, deutério e oxigénio, criptónio e xenónio, numa compulsiva análise ambiental marciana que Blue se impõe - e quase me dá vómitos num susto de enfado e ingerência claustrofóbica aquando pernoito junto de si, observando-o exaustivamente - vendo em admiração também, o quanto ele é exigente consigo mesmo, numa sua incansável pesquisa de grande proeminência e na qual eu não entro nem faço parte.
Blue é muito inteligente, compondo tabelas periódicas inexistentes no mais profundo oceano da minha ignorância terrestre. Tenta que sobrevivamos e só por isso lhe devo tudo. Até a vida além a própria vida de ambos... se é que isso existe...

Entrei na sala. Cometi um dos maiores pecados da Humanidade: a quadrilhice terrena! Bem... talvez não o maior, mas um dos mais inconvenientes.
Estava escuro. mas de imediato tudo acendeu em luz, som e vibração. A energia emanada soava a uma harmonia que não sei descrever por palavras. O meu coração batia. Queria ter voltado atrás mas sabia tal não me ser possível (ou mais tarde voltaria, o que talvez já não me fosse possível) e tentar reorganizar tudo de novo: principalmente na minha mente, que sentia querer atingir mais, saber mais, e recuperar tudo! Além o revolver montanhas do exíguo espaço dos suportes-vida daquela magna estrutura alienígena. Se o pensei, melhor o fiz, mesmo ante a rigorosa advertência de Blue para que tal não fizesse. Mas fiz. Entrei, invadi e tentei ir mais longe e esqueci recomendações: só me ouvia a mim...

Sei que tremia. Mas fiz-me continuar. Os meus passos encaminharam-me para aquela sala hermética, isolada de tudo; até do sentido exterior ou da extemporânea e descuidada acção que eu tentava reverter ali. Podia ser um tiro no escuro e, ter inclusive a represália não furiosa mas sensitiva de Blue que tanto me avisara para não esventrar espaços que não conhecia nem sabia se me seriam perniciosos - ou mesmo, proibitivos de ascender. Havia um mestre desconhecido, uma mente inorgânica ou imaterial que tudo comandava, dizia-me, sem que eu o considerasse em mim ou consolidasse do que me concebia como terrena que era. Para mim, tudo tinha um princípio, um meio e um fim, e eu queria saber quais seriam, e como, ou até quando... no descobrir, no desvendar, no realizar para mim e até para Blue. Sabia que ele me iria repreender mas não podia voltar atrás. Tentei olhar. Tentei compreender.

Toquei num dos painéis. E logo me arrependi. Senti como que um choque eléctrico em mim, mas sem o efeito nocivo do mesmo; sem doer. Era como se aquela encoberta coisa inteligível me estivesse a perscrutar ou a seguir os passos da mente. Não havia botões, alavancas ou quadros físicos ou digitais numa não lógica de raciocínio humano em que tudo tem de ter uma ignição, uma alavancagem mecânica ou artificial que se comanda e dá ordens: nada! Mas tudo parecia absorver energia, inteligência, movimento e mesmo percepção indistinguível de qualquer conhecimento terrestre. Sentia-me vigiada mas não sabia por quem. Sentia-me espicaçada, embora não soubesse até onde isso me levava. Mas tentei. E prossegui. Fechei os olhos e senti a alma daquela coisa sobre mim...

Como num sonho... como num outro mundo de inigualável beleza e assumpção, vi abrirem-se as portas de todo um conhecimento analógico, digitalmente impronunciável ou reproduzível (mais uma vez!) sobre um ou mais universos que não soube distinguir. Havia estrelas, enxames, muitos enxames de estrelas, supernovas, galáxias e até os tão enigmáticos buracos negros de insuspeita abordagem sem camuflagem sobre galáxias que se uniam, outras que se apartavam, e ainda outras que rumavam a outros horizontes cósmicos: como montanhas de luz, cor e som, no que me transpuseram para um infinito maravilhoso que eu só pensei poder ver aquando morresse...
A «minha» Via Láctea, depois da observação quase instantânea - e louca - de me ver sobrepor a visualização de vários outros sistemas solares, outros sóis, outras luas, planetas e demais massa cósmica que nem sei o nome, designação ou aferição científicas, tal a ergo-dimensão daquela matéria toda, a negra, a clara e luminosa, e depois os pequenos pontos cósmicos, perfilando-se aos que eu já conhecia do nosso sistema solar e, por fim, a Terra. Aqui, caí de joelhos e chorei que nem uma desalmada: estavam a guiar-me até à minha terra, ao meu lar, ao meu berço planetário - ao meu belo e por mim tão saudoso planeta Terra!
Vi o sítio onde nasci; a minha primeira escola, depois os amigos, os familiares e todo o percurso da minha vida na Terra - parecia que tinha morrido e agora, em fim de linha, me mostravam o que vivera e perdera. Ou ali readquirira sem o saber.

Pior o que estava para vir. Vi o meu casamento: o meu tão fastidioso e atormentado matrimónio que nem se chega a gozar ou usufruir não só por nos doerem os pés dos sapatos novos e apertados mas, pelos inevitáveis contratempos que temos de esconder (desde o vestido que não assenta bem ao ramo de flores que entretanto murchou... como se isso fosse uma causa maioritária no transtorno de uma guerra mundial) ou mesmo as confusões no momento dissipadas (ou apartadas) derivadas das bebedeiras de bar aberto em que convivas e familiares vão jorrando entre si, criando inimizades ou apenas breves episódios sem história. Estava tudo ali. E eu assistia.
Depois o nascimento dos meus filhos: dos meus queridos filhos que já perdera. Que malditos! Quem me pode fazer isto...? Quem...? Mas aqui já eu me desfazia em pranto e agonia, querendo tocar no painel, querendo tocar no Céu, querendo abraçá-los, apertá-los em mim, a guardá-los para mim... tanto que eu queria que a vida voltasse atrás, que este outro mundo me desse uma outra oportunidade de vida... mas não deu. Sem que me apercebesse de mais qualquer desfecho, estando para breve esse final, foi-me ofertado os últimos momentos de vida em abraço aconchegado, tendo ambos os meus filhos em meu redor, na despedida anunciada de um adeus que já não lembro... e depois, o nada.

Apagou-se tudo. Eu corri, gritei, gesticulei que voltassem para mim, que voltassem aquelas tão lindas imagens da minha querida família... mas nada. Nem um som. O vácuo foi total: nem imagem. som ou qualquer ruído. Tudo asséptico, fechado, cerrado para mim; cerrado para o mundo. Caí no chão. Não desfaleci mas senti que era este o meu derradeiro momento e, talvez o único, em que voltaria a ver aquelas imagens, a recordar o que na Terra fui e senti em abraço, beijo e amor vivido com todos os que amara - e entretanto perdera - num terrível acidente de viação. Fiquei em posição fetal e senti-me a morrer. Acho que morri.

O Blue está aqui. Veio até mim. A sua percepção extra-sensorial muito mais avançada do que a dos terrestres, levá-lo-ia até mim; eu, que tão esparramada estava por entre lágrimas, suplício e cilício que me corroía as entranhas como o mais crepitante fogo do inferno. E ele veio. Abeirou-se de mim e tocou-me com a sua alma, com a sua mão de quatro dedos azuis e eu olhei-o e então percebi: o Blue amava-me!
Tocou-me no rosto. Ergueu-me para si. Enleou-me em si. Olhou-me como nunca me olhara e beijou-me as lágrimas salgadas que eu já por diversas vezes saboreara num misto de horror e saudade por sentir um mar que jamais voltaria a ver, na água salgada de si, na água salgada dos maiores temores ou maiores amores que se vivem. O meu outro mar, ali, foi então observado pelo Blue que comigo o viu em oceanos da Terra, em oceanos de outras terras; mais uma vez, o Blue... salvou-me!

Fazer amor com um ser extraterrestre ou um ser civilizado mas de outra dimensão, outro mundo estelar, pode muito bem não ser de facto o que se suporia ser; ou que fosse na sua magnânima originalidade de empenho e, execução, mas sem anular expectativas. Podia ser um susto, um outro susto de morte... ou a mais infame e doentia experiência cumulada de enganos, de rastilhos letais ou pergaminhos muito pouco claros em face ao que nós sentimos, nós, humanos. Podia ser uma fatal coincidência de erros ou equívocos e depois tudo se perder, irreversivelmente! Mas não o foi.
Blue portou-se à altura tal como um normal ser humano, um comum ser terrestre que primeiro pergunta com os olhos da alma e depois nos dá o corpo em sua bênção máxima de se fazer pertencer, e nos sentir como parte de si. Foi o que sucedeu. O seu corpo azul ficou colado ao meu e eu deixei-me ir... deixei-me seduzir sem nada questionar ou sequer me opor; apenas queria o seu abraço, o seu afecto, o seu colo e o seu sexo. Queria sentir que estava viva e nada mais.

O seu cheiro é diferente do cheiro humano: é mais intenso; é mais sensitivo e menos olfactivo. As suas mãos no meu corpo, foi (e é!) algo tão intensamente sentido que nem sei descrever a tão pura sensação do seu corpo no meu, Os seus olhos transmitem-me segurança e falam com os meus.
Blue não tem nada de reptiliano (o seu corpo não é de escamas nem evidência tratos ou hábitos reptilários), sendo que me percorre o corpo como se este estivesse permanentemente em electricidade estática e, tivesse Blue uma farta cabeleira, lhe veria os cabelos em pé; os meus estariam, porventura. Existiu uma energia tão intensa e tão refulgente que daria para iluminar toda uma cidade como Nova Iorque, supus.
O meu coração batia descompassada e tortuosamente em arritmias tão incertas quanto vulneráveis que gritavam para que nada daquilo parasse. Eu só queria possuí-lo; tê-lo logo ali, para mim. E parecia que Blue entendia, pois fazia-me a vontade como cursor a quem se dá uma ordem precisa e este cumpre. Não temi. Nem sequer pensei que Blue me perfurasse o peito ou o ventre com um aguilhão que subrepticiamente tivesse escondido de mim (como nos velhos filmes da longa saga Alien, que eu vira na Terra; entre outros assim iguais...) e que Blue me fosse apenas e tão-só, o veículo vector de uma finalidade obscura ou de criar em mim mais expectativas forjadas do que a realidade - ou verdade - de um sentimento adquirido por ambos. Mas não. Penetrou-me, e fui sua, e ele meu. Tudo normal: até a sua ejaculação seminal que, à semelhança dos machos terrestres não deixaria por mãos alheias, ou seja, tudo normal na mais comum e perfeita prática terrena que eu conhecera e, no que eu lhe perspectivava mesmo sem querer, mas ele me percepcionava em quase precognição latente do ser superior que habitava em si. E faria perpetuar por muitas outras noites...

Depois... a serenidade, a calma, a bonança de dois corpos alados que se amam e se deleitam sobre o silêncio das almas. Na fleumática gravidade sentida... ficou a leveza dos corpos e daquele estranho chão que nos acobertou naquela e noutras noites, já no seu quarto - no meu quarto - no espaço dele e meu que se nos aproxima a cada dia mais... nos dias e noites em que ficamos abraçados sem nada dizer, sem nada objectar. Aquela, a primeira de  muitas outras noites em que acabei por dormir nos seus braços azuis; fortes e seguros, indestrutíveis. que me amparam e protegem neste mundo de Marte!

Outros dias, outras noites em que tanto me questionei, em que tanto me deixei seduzir por outras em que me refreei, sentindo estar a perder a razão. Que sou eu agora e o que fiz de mim...? Mas depois, olhando para Blue, para o seu desvelo, a sua preocupação comigo e todo o seu amor em relação a mim (acho que é amor!?) tornei-me a sua Messalina de Marte: só para si. E de novo, o seu corpo foi meu! Todo ele! Vorazmente! Ininterruptamente, como se o mundo fosse acabar! Ou já teria acabado...?! Não sei nem quero saber. Ele, Blue, é meu e eu dele, e só isso importa!

Não me perguntei se o clímax intemporal que vivi (desde essa primeira noite até agora...) foi melhor ou pior do que o dos humanos, pois não o sei dizer: foi apenas... diferente! Houve troca de fluidos, movimentos e sentimentos, tal como numa qualquer relação física e, sexual, entre humanos. Mas tem sido mais do que isso, muito mais: tem sido tão magistral, tão sentidamente recíproco o sentimento e o trocar de corpos numa interacção Terra-KIC que jamais me poderei pronunciar se acaso voltasse à Terra para isto partilhar, pois ninguém me acreditaria. Posso falar de cópula normal, como o designaria em referência animal - física e não mental ou de aferição cognitiva - numa situação que desde a Antiguidade até à era moderna se faz da mesma maneira, ainda que os sentimentos possam divagar ou se alterem consoante as épocas instituídas. Mas não. O que Blue me deu foi a reconstituição do que perdera: a crença de acreditar em mim, de acreditar na vida; de acreditar no amor. Poderá ser...? Penso que sim. Se tudo foi, se tudo senti... de novo! E para ele, como terá sido? Não o disse mas fez-me senti-lo. Penso que me ama. Será que estou errada...?

Mas o monstro cresce, cresce sempre dentro de nós em mais e maior espaço e que, à medida que cresce, se vai tornando gigante, tomando forma na suspeição, na insegurança e na reconquista de outros novos espaços: os da fragilidade e da inconsistência com o que anteriormente se viveu. E de novo as perguntas...
«Que fiz eu...?» (algo que sempre me questiono, aquando Blue deixa a minha cama vazia e, fria, do compartimento a que eu chamo de camarata-suporte desta estranha estrutura-estelar em Marte, mas na qual já sinto ser o meu lar. E o Blue sai omisso e em silêncio. E eu ainda lhe sinto o aroma a macho, ao meu macho de corpo azul, macio, aveludado, que não repudio, que não rejeito, mas antes anseio, desejo e quero ardentemente! Todos os dias; todas as noites! E em todos os momentos em que me vejo a si abraçada, ao seu delicioso corpo azul de temperatura média de 20ºC) - frio, portanto. O Blue só aquece quando me toca, ascendendo à minha idêntica temperatura média de 37ºC, ao que já me vou habituando, sentindo nele um ser de sangue frio que não o da sua alma, acredito. Mas ainda temo. Não quero amar um ser asqueroso, um réptil, ou um avatar com ideias estranhas... quero um «homem», meu Deus que disse eu...? Quero o Blue, e só isso me basta!

«E se eu engravidar...? Terei um monstro dentro de mim...?» - Pergunto-me isso todos os dias, por mais que tente evitar. As perguntas... e o método contraceptivo que não tomo, que não controlo e nem respeito. Que estarei indirectamente a fazer de mim...? Uma outra experiência de final infeliz...? Queira eu saber disso... se tudo me foi retirado; até o juízo! Que estupidez, não é? Quererei eu um pequeno ser azul (ainda que supra-inteligente) mas de quatro dedos em cada mão e cada pé e, nada de cabelos ou juba capilar e pêlos no corpo, ainda que de genitália comum à do ser humano? Ou estarei a enganar-me e tudo não passa de um execrável pesadelo infinito...? Quem quero eu enganar...?!

Não há retrocesso. Sou um caso perdido! Estou na idade adulta e procedo como a mais púbere ou estúpida virgem - e sobrevivente - na Terra ou em Marte! Até dá vontade de rir e, se não falo com alguém vou enlouquecer pela certa. Mas quem me ouviria...?
Que fiz eu, meu Deus, gerar um ser híbrido sem futuro algum, no meio de nenhures...? E se os meus receios são parvos, infundados e até estúpidos, pois se entre o Blue e eu nada fertilizar em ser inócuo, ser de nada, que em nós e sobre nós se fará... porque receio algo que pode criar vida, criar esperança, criar outro caminho, outra inteligência, outra vivência que não a minha ou de Blue...? Saberei conviver com isso...? Aprenderei a amar esse hipotético ser azul com quatro dedos e um sem número de diferenciações que na Terra me admoestariam como ser anómalo, deficiente e um autêntico monstro...? Que parva, eu sou. Não, na Terra, por que lá não voltarei... ou será que sim? Como gostaria de o saber... como gostaria que alguém mo dissesse...»

Mas voltámos a fazê-lo. Repetidamente! Que tenho eu a perder...? Talvez tudo o que me resta: a dignidade de ser terrestre que jamais voltará à sua terra. Então para quê tantos pruridos gritados, suados e, sentidos, de uma hecatombe em êxtase orgásmica tão comum e tão normal quanto o poderá ser uma ou mais relações vitais do cosmos, e deste ou de todos os outros Universos...? Estarei louca...? Ou, numa hegemonia que não procurei e não busquei, irei iniciar um outro processo de vida, aqui, em Marte...? E se sim, por que caminhos irei, que caminhos poderei percorrer que me não levem à extinção, à loucura ou à maldição de ter sido espoliada de tudo o que mais amava, havendo, agora, uma outra condição? Terei oportunidades disso? Poderei sobreviver a mais esta humilhação - ou sublevação - se acaso Blue não estiver completamente inteirado de toda a minha conturbada consciência em genética aviltada na larga sequência de uma amaldiçoada descendência...? Ou será tudo imaginação minha, perante um mundo novo que poderei construir - com Blue junto a mim - e eu, com mister-T por perto, sentir que posso ainda ser surpreendida por ter voltado a amar assim...
Será que o Blue sabe o que é o amor...? E se o não sabe, se o não conhece, por que mo diz com tão bela alma sua, penetrando na minha, fazendo-me flutuar e, acreditar, que ainda é possível ser feliz...

Mas será mesmo que Blue sente o que eu sinto...? Não será que tudo isto faz parte de um plano, um abominável e hediondo plano ao qual eu me deixei arrastar ímpia e despudoradamente sem pinga de amor por mim, desagregando tudo o que me institui como pessoa que sou...? Que serei agora? E que me resta mais, se não acreditar que Marte poderá ser a minha futura Terra...? E, a não ser, que mais de mim restará, se tudo não tiver passado de mais um pesadelo nesta terra em que os rios secaram, os mares partiram, e até a esperança se ressentiu de um dia a esta terra poder voltar... que mais poderei esperar se os vulcões solidificaram na lava o que se já não arranca e mesmo no ar, pútrido, em que este se adensa em laivos de inconsistência magnética que nos faz ser tão sonhadores quanto predigitadores?! Será pura ilusão...? Será minha alucinação...? Se for, não me acordem... não quero saber. Se já não tenho passado e me negam este estranho presente... então talvez nem valha a pena ter algo que me faça construir um sólido futuro...  que futuro terei...?

Será que Deus me ouve, aqui, em Marte??? Não está Ele em toda a parte...? Que terá Ele para me dizer de tudo isto ou também Ele já me abandonou à minha sorte...? Não creio. Penso que em Marte também se pode sonhar... por favor, deixem-me nisso acreditar, pois é só o que me resta...

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